segunda-feira, 30 de agosto de 2021

Apontamentos: Glaeser 2021 e a "cidade de 15 minutos"

GLAESER Edward, “The 15-minute city is a dead end — cities must be places of opportunity for everyone”. Blogs LSE 08-05-2021
https://blogs.lse.ac.uk/covid19/2021/05/28/the-15-minute-city-is-a-dead-end-cities-must-be-places-of-opportunity-for-everyone/

Our discussions and spending on urban mobility has over-emphasised the mobility of the rich. But we have largely ignored the mobility of the poor at all — especially in the US. I am very worried that a focus on enabling upper-middle-income people to walk around in their nice little 15-minute neighbourhood precludes the far larger issue of how we make sure our cities once again become places of opportunity for everyone. Enormous inequalities in cities are only tolerable if cities fulfill their historic mission of turning poor people into rich people. I am only interested in urban planning concepts that fundamentally solve that problem, and the 15-minute city seems likely to make that problem even worse. (Edward Glaeser)


Diagrama da
"cidade de 15 minutos",
por Moreno et al.*

Compartilho sem pestanejar com o autor deste pequeno artigo a defesa de políticas urbanas compensatórias como o  subsídio aos transportes públicos pela “taxa de congestionamento de tráfego” e a cobertura de seus custos pela exploração estatal da renda do solo urbano no entorno das estações. E concordo que é um escárnio subsidiar os transportes dos ricos e deixar que os dos pobres se paguem por si mesmos.

Também a mim não convence a fórmula da “cidade de 15 minutos”, derivada de uma preocupação com a sustentabilidade urbanística que, embora louvável, é no mínimo parcial, e irreal, no que tange à composição da força de trabalho e, mais amplamente, ao papel e modus operandi das grandes metrópoles no processo de geração e distribuição da riqueza global.

Divirjo, porém, do autor - se o entendi corretamente - no postulado de que a “missão histórica” da cidade é propiciar, pela via das “oportunidades” que só a aglomeração em grande escala e a mobilidade generalizada podem criar, a ascensão social dos "pobres" em quantidade suficiente para tornar “tolerável” a permanência de suas “enormes desigualdades”.

Se a “missão histórica” das grandes metrópoles é, em nome das "oportunidades para os pobres", seguir sendo uma armadilha civilizacional concentradora de crescimento econômico e acumulação competitiva da riqueza, portanto também de deseconomias, desperdício, desemprego, precariedade, pobreza, moradia subnormal e degradação ambiental, deduzo que ela está esgotada e que precisamos rever nossos conceitos em favor de uma economia e uma urbanização autenticamente sociais e ambientalmente sustentáveis, portanto essencialmente planejadas.

A cidade democrática é, para mim, um problema totalmente em aberto, em que mesmo as melhores soluções e práticas atuais são meramente transitórias. A “função social da propriedade”, tão cara aos urbanistas, é um ótimo ponto de partida programático para o redesenho das cidades, desde que estabelecida em um marco constitucional que defina “função social” não como um requerimento acessório, somente afeto à “propriedade urbana” e dado por cumprido quando em conformidade com "as exigências fundamentais de ordenação da cidade expressas no Plano Diretor” (Art. 182 §2º da Constituição Federal brasileira de 1988), mas como o conteúdo do direito de propriedade em geral, pedra angular de todas as Constituições ditas democráticas do planeta.

___
*MORENO Carlos et al, “Introducing the “15-Minute City”: Sustainability, Resilience and Place Identity in Future Post-Pandemic Cities”. Smart Cities 2021, 4(1), 93-111.
https://www.mdpi.com/2624-6511/4/1/6/htm

2021-08-28